O corredor tava mais comprido do
que o normal. É sempre assim quando eu tenho pressa. O toc toc frenético e
proibido dos meus sapatos deve ter te chamado a atenção. Frente a frente, e
quase dentro daquele abraço que você insiste em me afogar, te ouvi: “Oi. E aí,
tudo bem?”. Puxei o ar pra dentro do peito, pressionei levemente os lábios,
dei uma longa piscadela e arrisquei: “É uma pergunta retórica ou você quer
mesmo saber?”. Te peguei de surpresa. Por educação, você disse: “Quero mesmo
saber, oras”. Era mentira, mas eu ignorei. Engoli a saliva gelada, como quase
todo o resto do meu corpo e, com a respiração descompassada, lancei: “Na
verdade, não está tudo bem. Não está bem porque não aguento ter tanto pra te
oferecer. Se você soubesse o quanto eu quero te fazer bem, não agiria com essa displicência.
Eu te enxergo devagar enquanto um monte de gente de olha correndo, e, cá entre
nós, até meio maluco te acham. Eu entro na tua maluquice e consigo achar ela fofa. Eu
poderia te ouvir por dias sem sequer olhar para o celular. Só que eu vejo a
gente indo embora um do outro sem nem ter conseguido chegar e só consigo lamentar
profundamente por isso. Porque eu quero te encontrar! Não assim, pelo corredor,
mas encontrar aquilo que até você mesmo vem procurando, e quero deixar que me procure
também. Se você acha que eu to viajando, por favor, fala alguma coisa. Eu vou
te deixar ir e aceitar todos os teus motivos, mas você vai precisar parar de me
confundir. Eu queria que você ficasse, mas não to te pedindo isso. Só quero que
você deixe as coisas mais claras; é algo que venho querendo fazer na
minha vida e na vida dos outros: clarificar. Sem adivinhações, sem penumbra. Só
quero o que é bom e de verdade, porque é o que eu tenho nos bolsos pra te
dar. Espero que você não demore pra entender tudo isso e venha logo. Ou siga em
frente de uma vez. Só não fique no meio do caminho, por favor. É isso. E
contigo, tudo bem?” (...)
Você continuava na minha frente, escondido atrás dos óculos e com aquele sorriso tímido
refletido em mim. Tornou a perguntar: “Tudo bem?”. Acordei do sopor, puxei o ar pra dentro do peito, pressionei levemente os lábios, dei uma longa piscadela e disse: “Tudo. Tudo certo. E contigo?”. “Também, tudo certo.” “Então tá, até mais.” “Até”. E retomei o corredor sem fim.
Mas que merda.
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